Amados irmãos e irmãs, temos quarenta dias para
aprofundar esta extraordinária experiência ascética e espiritual. No
Evangelho que foi proclamado, Jesus indica quais são os instrumentos
úteis para realizar a autêntica renovação interior e comunitária: as
obras de caridade (a esmola), a oração e a penitência (o jejum). São as
três práticas fundamentais queridas também à tradição hebraica, porque
contribuem para purificar o homem aos olhos de Deus (cf. Mt 6, 1-6.16-18).
Reflexões para o Ano Litúrgico. Anos A, B e C - PAPA BENTO XVI |
Estes gestos exteriores, que devem ser realizados para
agradar a Deus e não para obter a aprovação e o consenso dos homens, são
por Ele aceites se expressam a determinação do coração a servi-l'O, com
simplicidade e generosidade. Recorda-nos isto também um dos Prefácios
quaresmais onde, em relação ao jejum, lemos esta singular expressão: "ieiunio... mentem elevas: com o jejum elevas o espírito" (Prefácio IV).
O jejum, ao qual a Igreja nos convida neste tempo forte,
certamente não nasce de motivações de ordem física ou estética, mas
brota da exigência que o homem tem de uma purificação interior que o
desintoxique da poluição do pecado e do mal; que o eduque para aquelas
renúncias saudáveis que libertam o crente da escravidão do próprio eu;
que o torne mais atento e disponível à escuta de Deus e ao serviço dos
irmãos. Por esta razão o jejum e as outras práticas quaresmais são
consideradas pela tradição cristã "armas" espirituais para combater o
mal, as paixões negativas e os vícios. A este propósito, apraz-me ouvir
de novo convosco um breve comentário de São João Crisóstomo. "Como no
findar do Inverno escreve ele volta a estação do Verão e o navegante
arrasta para o mar a nave, o soldado limpa as armas e treina o cavalo
para a luta, o agricultor lima a foice, o viandante revigorado
prepara-se para a longa viagem e o atleta depõe as vestes e prepara-se
para as competições; assim também nós, no início deste jejum, quase no
regresso de uma Primavera espiritual forjamos as armas como os soldados,
limamos a foice como os agricultores, e como timoneiros reorganizamos a
nave do nosso espírito para enfrentar as ondas das paixões. Como
viandantes retomamos a viagem rumo ao céu e como atletas preparamo-nos
para a luta com o despojamento de tudo".
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